Tarifa social vira pretexto para tarifaço, enquanto custos com terceiros e a PPP disparam


Cerca de 600 mil consumidores da Sanesul, em 68 municípios de Mato Grosso do Sul, vão enfrentar um aumento expressivo nas tarifas de água e esgoto, após a Agência Estadual de Regulação (AGEMS) autorizar uma revisão tarifária de 22,13%, dividida em duas etapas: 14,6% a partir de janeiro de 2026 e mais 7,52% em janeiro de 2027.

O aumento foi justificado oficialmente pelo impacto da Tarifa Social, que beneficiará 50,6 mil famílias de baixa renda com desconto de 50% na conta de água. No entanto, dados técnicos, balanços financeiros da própria empresa e a própria Nota Técnica da AGEMS colocam essa explicação sob forte questionamento.

Nota técnica indicava reajuste de apenas 7,98%

Inicialmente, a própria AGEMS, por meio de nota técnica de 44 páginas, apontava que o Índice de Reajuste Tarifário (IRT) necessário seria de 7,98%, percentual apresentado em consulta pública e em audiência realizada no dia 14 de novembro.

Somente após essas etapas, segundo a agência, a Secretaria de Estado de Assistência Social informou oficialmente a quantidade de famílias que seriam inseridas automaticamente na Tarifa Social com base na Lei Federal nº 14.898/2024. A partir disso, a AGEMS recalculou os números e elevou o reajuste final para 22,13%, ou seja, um acréscimo extra de 14,15 pontos percentuais sobre aquilo que seus próprios técnicos haviam inicialmente projetado.

É justamente essa virada nos números que o Sindágua-MS considera tecnicamente frágil e socialmente injusta.

Consumo das famílias beneficiadas é mínimo no sistema

Segundo dados oficiais:
– As 50,6 mil famílias da Tarifa Social poderão consumir juntas até 894 milhões de litros de água por ano.
– A Sanesul produz, em média, 141 bilhões de litros de água por ano para atender atualmente mais de 700.000 residências, totalizando 1,7 milhão de habitantes do Estado do Mato do Sul.

Ou seja, o volume com desconto representa apenas 0,63% de toda a água distribuída pela empresa, mas está sendo usado como justificativa para um aumento que recairá sobre 100% dos consumidores.

O que realmente explodiu: os custos com terceirizações e PPPs

Enquanto a Tarifa Social atinge menos de 1% do volume de água distribuído, os custos com terceiros e PPPs da Sanesul cresceram de forma explosiva nos últimos anos — e esses números constam nos próprios balanços oficiais da companhia.

Levantamento detalhado feito pelo presidente do Sindágua-MS, Lázaro Godoy Neto, aponta:

Em 2020:
– Custos com terceiros: R$ 193,5 milhões
– Despesas com empregados + alta administração: R$ 144,34 milhões

Em 2024:
– Custos com terceiros: R$ 302,6 milhões
– Despesas com empregados + alta administração: R$ 183,8 milhões

Isso representa:
– Aumento de 56,36% nos custos com terceiros (PPP e terceirizações)
– Aumento de apenas 27,4% nas despesas com pessoal
– Em 2020, terceirizações já eram 34% maiores que os gastos com trabalhadores
– Em 2024, essa diferença salta para 64,5%

Para o Sindágua-MS, os números revelam com clareza onde está o verdadeiro rombo que vem sendo repassado à população.

“Os custos com terceiros praticamente dispararam com as PPPs, enquanto a empresa tenta jogar a culpa do tarifaço nos mais pobres. A matemática não fecha”, alerta Lázaro Godoy Neto.

Consultorias milionárias e cálculos questionados

Outro ponto que chama atenção é que os cálculos usados para justificar o reajuste final foram elaborados por duas consultorias privadas:
– A Quantum, contratada pela Sanesul por R$ 4,8 milhões
– A Fundação Theodomiro Santiago (FTS), contratada pela AGEMS por R$ 2 milhões
– Foram essas consultorias que recomendaram a chamada Tarifa Média de -Equilíbrio de R$ 6,77 e o Índice de Reposicionamento Tarifário de 22,13%

Ainda assim, conforme destacou Lázaro Godoy, a própria Nota Técnica da AGEMS não demonstra, de forma transparente ao longo de suas 44 páginas, a construção matemática que leva dos 7,98% iniciais aos 22,13% finais.

Tarifa social automática e sem requerimento

De acordo com a portaria da AGEMS, o desconto da Tarifa Social será concedido automaticamente, sem necessidade de solicitação por parte do consumidor. As informações virão diretamente da Secretaria de Assistência Social, via CadÚnico.

O Sindágua-MS reconhece a importância da Tarifa Social como política pública, mas rejeita que seja usada como cortina de fumaça para encobrir aumentos provocados por má gestão, contratos de PPP, terceirizações e consultorias milionárias.

“A conta não pode cair, mais uma vez, nas costas da população”

Para o sindicato, a pergunta central segue sem resposta:
– Onde estão os investimentos do CAPEX de 2021 a 2025 da ordem de R$ 400 milhões e os investimentos na Operação e Manutenção de R$ 350 milhões?
– Onde está a transparência desses valores investidos onde essa PPP já recebeu mais de R$ 400 milhões da SANESUL?
– Onde estão aplicados os recursos recebidos?
– Por que os lucros e os contratos com terceiros não são revistos?
– Por que os acionistas continuam protegidos, enquanto os consumidores arcam com reajustes sucessivos?
– Por que os custos das PPPs são socializados, mas os ganhos permanecem privatizados?

“A Tarifa Social é um direito. O que não é justo é usar esse direito para justificar um tarifaço que, na prática, está ligado ao avanço das PPPs e da terceirização”, reforça Lázaro.

O Sindágua-MS vai seguir cobrando transparência total nos cálculos, revisão dos contratos de terceiros e proteção real à população, especialmente num cenário em que a água e o saneamento já pesam cada vez mais no orçamento das famílias sul-mato-grossenses.

Assessoria de Comunicação – Sindágua-MS

Veja a nota técnica:

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