Processos movidos pelo Sindágua-MS confirmam o descumprimento do piso salarial previsto em lei e reforçam a importância da luta sindical pela valorização profissional
A longa batalha judicial movida pelos engenheiros da Sanesul contra o descumprimento do piso salarial previsto na Lei Federal nº 4.950-A/66, equivalente a 8,5 salários-mínimos para jornada de 8 horas, teve mais uma vitória dos trabalhadores. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) e o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitaram novos recursos da empresa, classificando-os como tentativas protelatórias e reafirmando a validade das decisões anteriores favoráveis à categoria.
A ação foi proposta em 2010 pelo Sindágua-MS, após a estatal descumprir o pagamento do piso profissional. O processo entrou em fase de liquidação em 18 de outubro de 2017, mas desde então a Sanesul vem apresentando recursos com o objetivo de adiar a execução das indenizações devidas.
Tentativas frustradas de reverter decisões
Em suas últimas tentativas, a empresa buscou revisar os valores devidos aos engenheiros Auro Rigotti, José Carlos Tapparo e Julio Seba Bobadilha, argumentando que o cálculo das diferenças salariais deveria considerar a data do concurso público e não a da contratação. No entanto, a própria empresa reconheceu em documento judicial:
“…a ré indica que os substituídos Auro Rigotti, José Carlos Tapparo e Julio Seba Bobadilha, tomaram posse em concurso público em julho de 1998, mas trabalhavam na empresa desde 1993, exceto José Carlos, que iniciou em 1989, por certo que o valor de parâmetro para apuração deve observar a data da contratação e não a data do concurso público, observando-se o que consta do título executivo judicial.”
A tentativa foi negada pelo juízo de primeiro grau e, posteriormente, por unanimidade pelos desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (TRT-24).
Decisão do STF: recurso considerado protelatório
Insatisfeita, a Sanesul levou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF), por meio da Reclamação nº 76.707, sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia. A empresa alegava descumprimento da Súmula Vinculante nº 43, que trata da necessidade de concurso público para provimento de cargos.
No entanto, a ministra foi categórica ao afastar essa interpretação, afirmando que o objeto da reclamação não dizia respeito a provimento de cargos, mas apenas às datas iniciais dos cálculos salariais:
“A Súmula Vinculante n. 43 deste Supremo Tribunal Federal versa sobre inconstitucionalidade de provimento de cargo público sem prévia aprovação em concurso público. O ato reclamado trata de datas iniciais dos cálculos de diferenças salariais.”
A ministra ainda advertiu sobre o caráter protelatório dos recursos da empresa:
“Ressalte-se que eventual recurso manifestamente inadmissível contra esta decisão demonstraria apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional, o que sujeitaria a parte à aplicação da multa processual do § 4º do art. 1.021 do Código de Processo Civil.”
A decisão foi publicada em 27 de fevereiro de 2025, e negou seguimento à reclamação da Sanesul, confirmando o direito dos engenheiros às diferenças salariais determinadas pela Justiça do Trabalho.
Nova derrota no TST: ausência de fundamentação inviabilizou recurso
Mesmo após o posicionamento do STF, a Sanesul insistiu na tentativa de reverter a execução, apresentando um Agravo de Instrumento em Recurso de Revista (AIRR nº 0000852-75.2010.5.24.0003) ao Tribunal Superior do Trabalho, julgado pela 8ª Turma, sob a relatoria do ministro Sérgio Pinto Martins.
O recurso foi pautado em 13 de outubro e encerrado em 20 de outubro de 2025, sendo novamente rejeitado. O TST concluiu que a Sanesul não atendeu aos requisitos formais exigidos pelo artigo 896, §1º-A, da CLT, por não indicar de forma precisa o trecho da decisão recorrida que fundamentava a controvérsia:
“Ante a inobservância do requisito formal, mostra-se inviabilizado o exame da controvérsia.”
A decisão foi acompanhada pela ministra Dora Maria da Costa e pelo ministro Evandro Pereira Valadão Lopes, consolidando a derrota da empresa e confirmando o direito dos engenheiros representados pelo Sindágua-MS.
Sindágua-MS cobra cumprimento das sentenças e fiscalização do Plano de Cargos e Carreiras
Para o presidente do Sindágua-MS, Lázaro de Godoy Neto, as recentes decisões encerram uma longa disputa e reafirmam o papel da Justiça do Trabalho na defesa dos direitos profissionais.
“Esperamos que com essas decisões a Justiça Trabalhista execute as sentenças em prol dos engenheiros cujos pisos salariais de 8,5 salários-mínimos não foram cumpridos à época. E o SINDÁGUA irá verificar se essa condição prevista em lei está ou não sendo cumprida dentro dos últimos Planos de Cargos e Carreiras implementados. Caso existam discrepâncias, vamos representar em defesa da categoria.”
O sindicato reforça que seguirá acompanhando o caso e cobrando o cumprimento integral da sentença judicial. A decisão representa não apenas uma vitória dos engenheiros, mas também um marco contra o uso indevido de recursos jurídicos que visam protelar o pagamento de direitos trabalhistas reconhecidos há mais de uma década.
Assessoria de Comunicação – Sindágua-MS
Seguem para leitura:
. Reclamação nº 76.707 – STF (Ministra Cármen Lúcia)
. AIRR nº 0000852-75.2010.5.24.0003 – TST (Ministro Sérgio Pinto Martins)
RECLAMAÇÃO 76.707 MATO GROSSO DO SUL
STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
RELATORA: Ministra Carmén Lúcia
Relatório
1. Reclamação, com requerimento de medida liminar, ajuizada, em 24.2.2025, pela Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul S/A – SANESUL contra a seguinte decisão do juízo da Terceira Vara do Trabalho de Campo Grande no Processo n. 0000852-75.2010.5.24.0003, pela qual se alega ter sido exarada em descumprimento da Súmula Vinculante n. 43 do Supremo Tribunal Federal:
“EXCESSO NO CÁLCULO – CONCURSO PÚBLICO
Insurge-se a ré em relação à inclusão dos substituídos Auro Rigotti, José Carlos Tapparo e Julio Seba Bobadilha, na conta apurada pelo perito, alegando que por ocasião do ingresso mediante concurso público, já auferiam remuneração superior ao piso da categoria. Se rejeitado o pedido principal, insurge-se a ré em relação aos valores apurados para os referidos substituídos, indicando a importância da diferença para cada um deles, fls. 3467 e 3471.
…
Por sua vez, o acórdão proferido no Eg. TST, assim dispôs, complementando o título executivo judicial, fl. 1448:
‘Dou provimento ao recurso para, reformando o acórdão regional, condenar a Reclamada ao pagamento das diferenças salariais resultantes da inobservância à época da contratação, do salário-mínimo profissional, com os reajustes experimentados no período contratual, conforme apurado em liquidação, nos termos da Orientação jurisprudencial nº 71 da SBDI-2’
Observando-se que na petição de fl. 1858 a ré indica que os substituídos Auro Rigotti, José Carlos Tapparo e Julio Seba Bobadilha, tomaram posse em concurso público em julho de 1998, mas trabalhavam na empresa desde 1993, exceto José Carlos, que iniciou em 1989, por certo que o valor de parâmetro para apuração deve observar a data da contratação e não a data do concurso público, observando-se o que consta do título executivo judicial.
…
A reclamante anota que, na origem, “o Sindicato dos Trab. Ind. Purif. Distr. Água Serv. Esg. MS ingressou com cumprimento de sentença em razão da condenação da Reclamante a ajustar o salário dos Engenheiros pertencentes ao quadro na Reclamante, conforme piso salarial da categoria, previsto na Lei nº 4.950-A/66, bem como efetuar o pagamento das diferenças salariais no período de 5 (cinco) anos que antecederam a propositura da ação, (autos nº 0000852-75.2010.5.24.0003)” (fl. 2).
Sustenta que “pleiteou a nulidade de contratos sem concurso público, razão pela qual a data inicial dos cálculos para os 3 (três) substituídos nessa condição, quais sejam, Auro Cesar Rigoti, José Carlos Tapparo e Julio Seba Bobadilha, deveria ser do ingresso por concurso público, mas o Douto Juiz de 1º Grau, em total descompasso com a Súmula Vinculante 43 do STF (Supremo Tribunal Federal), acabou por indeferir esse pedido da Reclamante” (fl. 2).
7. Pelo exposto, nego seguimento à presente reclamação (§ 1º do art. 21 e parágrafo único do art. 161 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), prejudicado o requerimento de medida liminar.
Ressalte-se que eventual recurso manifestamente inadmissível contra esta decisão demonstraria apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional, o que sujeitaria a parte à aplicação da multa processual do § 4º do art. 1.021 do Código de Processo Civil.
Publique-se.
Brasília, 27 de fevereiro de 2025.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora
AIRR – 0000852-75.2010.5.24.0003 (TST)
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – LEI Nº 13.467/2017 – EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM AÇÃO COLETIVA. IMPUGNAÇÃO À CONTA ELABORADA PELO CONTADOR DO JUÍZO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DA ALEGADA INCONSISTÊNCIA OU EQUÍVOCO. EFEITOS. TRANSCRIÇÃO APENAS DA EMENTA DO ACÓRDÃO REGIONAL. RECURSO DE REVISTA EM QUE NÃO SE ATENDEU AO DISPOSTO NO INCISO I DO § 1º-A DO ART. 896 DA CLT. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA. Interposto o recurso de revista sob a égide da Lei nº 13.015/2014, a parte recorrente deve transcrever precisamente o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia, conforme determina o inciso I do § 1º do art. 896 da CLT, sob pena de não conhecimento do apelo. No presente caso, a parte não atendeu ao referido preceito legal, porque transcreveu trecho da ementa do julgado, o que, nos termos do que ficou decidido pela SbDI-1 deste Tribunal, não atende à exigência legal, pois não serve para demonstrar o prequestionamento da matéria que o recorrente pretende debater. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
V O T O
1 – CONHECIMENTO
Conheço do agravo de instrumento, pois estão preenchidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade.
2 – MÉRITO
EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA EM AÇÃO COLETIVA. IMPUGNAÇÃO À CONTA ELABORADA PELO CONTADOR DO JUÍZO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DA ALEGADA INCONSISTÊNCIA OU EQUÍVOCO. EFEITOS
Registre-se que interposto o recurso de revista sob a égide da Lei nº 13.015/2014, a parte recorrente deve indicar precisamente o trecho do acórdão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia, conforme determina o inciso I do § 1º-A do artigo 896 da CLT, sob pena de não conhecimento do apelo.
No caso dos autos, porém, a parte recorrente, em suas razões de recurso de revista (fls. 4.271), não atendeu regularmente ao referido preceito, pois o trecho transcrito nas razões de recurso de revista correspondem à ementa do julgado, o que, no entender da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais deste Tribunal, não atende à exigência legal:
“RECURSO DE EMBARGOS REGIDO PELAS LEIS Nos 13.015/2014 E 13.105/2015. HORAS ‘IN ITINERE’. RECURSO DE REVISTA QUE NÃO ATENDE À EXIGÊNCIA CONTIDA NO ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT. TRANSCRIÇÃO DA EMENTA. 1. A Eg. 5ª Turma deu provimento ao recurso de revista do reclamante. No julgamento dos embargos de declaração, concluiu que ‘o reclamante, nas razões do seu recurso de revista, transcreveu a ementa, na qual contém o resumo da tese esposada pelo egrégio Colegiado Regional acerca das horas ‘in itinere‘ , sendo, portanto, observado o disposto no artigo 896, § 1º-A, da CLT’. 2. Diante da sistemática inaugurada pela Lei nº 13.015/2014, que instituiu o inciso I do § 1º-A do art. 896 da CLT, não se conhece do recurso de revista quando a parte não indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do apelo. 3. Conforme precedentes desta Subseção e de Turmas desta Corte, a transcrição da ementa do acórdão regional não atende ao escopo da norma. Recurso de embargos conhecido e provido.” (TST-E-ED-RR-685-97.2014.5.03.0069, SbDI-1, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT de 14/9/2018).
Julgado da Oitava Turma no mencionado sentido: AIRR-0010598-09.2024.5.03.0181, Relator Ministro Sergio Pinto Martins, DEJT 17/09/2025.
Ante a inobservância do requisito formal, mostra-se inviabilizado o exame da controvérsia.
Diante desse quadro, não há como reconhecer a existência de transcendência.
Nego provimento.
Relator: Ministro Sergio Pinto Martins
Acompanharam o Voto do Relator:
Ministra Dora Maria da Costa
Ministro Evandro Pereira Valadão Lopes